domingo, 21 de março de 2010

65) The Power Lies in the Middle: Interview with Iran Expert Vali Nasr (Fonte: Qantara.de)

Interview with Iran Expert Vali Nasr



Political scientist Vali Nasr is an advisor to US President Barack Obama and is viewed as one of the country's leading specialists on Iran. In his view, recent reform movements in the Islamic world are partially driven by a new middle class. Ramon Schack spoke to him


Vali Nasr (photo: Martin H. Simon, source: Wikipedia)
Bild vergrössern"We can see from history and recent experience that an independent bourgeoisie is a force for liberalism and democracy, and also stability and moderation," Vali Nasr says
In your book "Forces of Fortune" you analyse the new middle class in the Middle East, which has effected long-term change on the national economies of countries such as Turkey, Dubai and other countries in the region. In your view, does the sustained unrest in Iran also represent an uprising of this new middle class?


Vali Nasr: As I discuss in my book the reform movement in Iran has its roots in the rise of a new middle class that since the late 1980s grew in size as the Iranian economy privatized and opened up to some extent. As this middle class grew in size and prosperity it demanded more cultural openness, political freedoms and engagements with the global economy and world culture. In many ways, in Iran economic opening preceded demands for political opening.

Economic activism supported civil society growth and reflected growing middle class values. Both the power and limits to reform movement today is reflective of the relative size of the middle class and the private sector economy it relies on. The middle class has made the reform movement possible, but the middle class is not yet large enough to guarantee its ultimate success.


The Dubai stock exchange (photo: AP)
Bild vergrössernModern Islamic societies in flux: The new bourgeois middle class is not dependent on the state, but on the markets, says Vali Nasr
In the past, the middle classes in the Middle East were often propped up and controlled by whichever regime happened to be in power – for example through political campaigns in the education system or through forced cultural change. How does today’s new middle class differ from the old one in the countries of the region?


Nasr: The old middle class is not a bourgeoisie as the term is understood, and therefore has not played the historical role of a bourgeoisie. A middle class that is created by the state and depends on the state is ultimately not a force for political change. The middle class that transformed the West and is now transforming large parts of newly-industrializing world is not dependent on the state, but on markets – its interests are tied to the global economy and it absorbs cultural and political values that would serve its economic interests.

We can see from history and recent experience that an independent bourgeoisie – a middle class tied to markets and commerce – is a force for liberalism and democracy, and also stability and moderation. The old middle class was not capitalist but statist, the new middle class is capitalist – it is much closer to the historical models that have shaped modernity, democracy and global markets everywhere.


photo: AP
Bild vergrössernAn independent bourgeoisie as a motor for the development of democracy and a market economy, for stability and the decline of radical ideologies: a modern Iranian woman in Tehran
How could Islamic nations such as Iran be integrated into the global economy?


Nasr: As I discuss in my book, integration in the global economy is a matter of internal economic reform combined with greater trade. This combination forces economies to change, and ties wealth generation – and the class that most benefits from it – to global economy and culture. The economic transformation then requires legal and political reform and these put together force countries to align their interests with the rest of the world and embrace more open political systems governed by law and universal values.

If you analyse the foreign and defence policies of the US over the past few years, would you argue in favour of placing less emphasis on political pressure and military might, and more on opening up world markets in order to better integrate the Islamic world?

Nasr: The economic transformation I write about is a long-run solution to the larger problems the West faces in the Muslim world. In the long run if the climate of confrontation and distrust between the West and the Muslim world is to be replaced by the kind of relations that exist between the West and Asia or Latin America, then there has to be more economic ties and shared economic values and interests and participation in the same global market.


Cover 'Forces of Fortune' by Vali Nasr (image: publisher)
Bild vergrössern"Forces of Fortune": Vali Nasr believes a prosperous Muslim middle class will bring stability and democracy to the Middle East
Presently it appears that the "Chinese model", which champions economic liberalisation coupled with an authoritarian leadership, is gaining worldwide appeal. Might such a model not be more attractive for Islamic countries than the western system that you yourself admire? This would mean that regimes there would be spared a loss of power, which is something that has to be in their best interests.


Nasr: The Chinese model has certain attraction for many countries that are moving beyond authoritarianism and closed economies. Perhaps the Chinese model itself is a transition phase – albeit a longer one – to democratic capitalism. But what is important in discussion of the Muslim world is not the system of government, but that even in China the middle class, as it integrates into the global economy, it adopts certain values and interests – so whether more authoritarian or more democratic, China's middle class is embracing many global economic and cultural values, and interdependence obviates open confrontation.


Interview by Ramon Schack

© Qantara.de 2010 

sábado, 20 de março de 2010

64) Filosofia e Pensamento Crítico. (Fonte: blog.criticanarede.blogspot)


Filosofia e pensamento crítico

http://www.youtube.com/watch?v=KgijJNrQY_o
O Tomás Magalhães Carneiro tem desenvolvido um importante trabalho com sessões públicas de filosofia prática, no seu Café Filosófico. O Tomás resolveu gravar algumas dessas sessões e partilhar com todos na internet. Para além de tudo esta parece-me ser uma boa atitude já que não temos disponíveis muitos vídeos de filosofia e pensamento crítico disponíveis em língua portuguesa. Pode aceder neste link.
[Rolando Almeida]

sexta-feira, 19 de março de 2010

63) Investigações Lógicas.

Página de Origem.


Investigações Lógicas, de Gottlob Frege
Organização, tradução e notas de Paulo Alcoforado
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2002, 112 pp.
Comprar
Gottlob Frege (1848-1925), um dos fundadores da filosofia analítica, revolucionou a lógica. Em meio da sua tentativa de derivar a aritmética a partir da lógica, em 1879 ele publicou a sua Begriffsschrift (Ideografia), o primeiro ensaio a conter o cálculo dos predicados e que deu origem à lógica clássica que utilizamos hoje. Sua Ideografia consistiria, grosso modo, numa linguagem simbólica capaz de substituir e suplementar a linguagem natural face à imprecisão e insuficiência desta para usos científicos. A difícil tarefa de fundamentar as noções básicas da aritmética exigiria uma linguagem rigorosa, um instrumento seguro para garantir a exatidão na dedução, com axiomas e regras de inferência elucidadas a cada passo. Essa linguagem também não recorreria à intuição, que ao longo da história da matemática mostrou ser um guia pouco confiável nas demonstrações.
A lógica fundada por Frege representa um enorme avanço em relação às lógicas anteriores e não é apenas um tipo de lógica diferente, uma "alternativa" à lógica aristotélica. Mais especificamente, a lógica clássica não só contém a lógica aristotélica como também permite explicar sintaticamente alguns aspectos da lógica aristotélica que a sua linguagem silogística não consegue explicar. Na verdade a lógica aristotélica só pode ser aplicada a classes não vazias, ao passo que a lógica de predicados de Frege ultrapassa essa limitação. Sua lógica também representa um avanço em relação a outros de seus precursores. George Boole (1815-1864), por exemplo, procurou elementos e fórmulas da aritmética para construir sua lógica. Frege, ao contrário, procurou separar cuidadosamente os símbolos lógicos dos aritméticos, justamente porque pretendia utilizar a lógica para fundamentar a aritmética. A lógica de Boole se parece mais com um calculus ratiocinator que é incapaz de exprimir todas as expressões e formas de inferência, que Frege visava com sua Ideografia.
O programa logicista de derivar a aritmética a partir da lógica se encontra hoje em descrédito, mas a pretensão de Frege em encontrar uma linguagem adequada para realizar tal tarefa culminou na sua imensa contribuição à lógica. Além disso, Frege desenvolveu uma série de conceitos e questões em filosofia que interessam ainda hoje, como a sua crítica ao psicologismo e a célebre distinção entre sentido e referência, só para mencionar algumas de suas contribuições filosóficas. Neste livro encontramos quatro trabalhos que se convencionou reunir em uma única obra sob o título de Investigações Lógicas: "O Pensamento", "A Negação", "Pensamentos Compostos" e "A Generalidade Lógica". A tradução de Paulo Alcoforado, um dos maiores conhecedores de Frege no Brasil, é competente. O livro também vem acompanhado de um interessante Corpus Fregeanum, que além de listar todas as obras de Frege apresenta obras contemporâneas que contêm seus escritos.
Um dos exemplos da originalidade filosófica de Frege é sua explicação do pensamento, apresentada no primeiro artigo. Quando duas pessoas entendem o sentido da sentença "O chocolate é doce", elas partilham do mesmo pensamento. É claro que quando alguém pensa "O chocolate é doce" diversos eventos psicológicos podem acontecer, como memórias do sabor do chocolate, sensações e imagens mentais — é o que Frege denomina de idéias. Mas ao contrário das idéias, eventos que pertencem ao mundo psicológico do sujeito, os pensamentos são completamente partilháveis e objetivos nos diferentes indivíduos que podem reconhecê-los e associá-los com palavras. Negar isso seria o mesmo que negar a possibilidade de comunicação.
Frege também entende os pensamentos como objetivos noutro sentido. Poderíamos afirmar que os pensamentos são partilháveis e ao mesmo tempo sustentar que sua existência e propriedades são dependentes da atividade humana. Mas não é essa a perspectiva de Frege. Para ele os pensamentos também são objetivos no sentido em que existem independentemente da atividade humana. Os pensamentos não são criados e nem surgem do processo de pensar; existem mesmo que não os tenhamos reconhecido, ou mesmo que nunca fossemos capaz de reconhecê-los. Assim como os planetas não passam a existir apenas quando são descobertos, também os pensamentos "já estão lá", em um outro mundo metafísico e de alguma maneira à espera de nossa compreensão. Além disso, os dois tipos de objetividade (capacidade de serem partilháveis e independência) também são aplicáveis à verdade dos pensamentos.
Neste ponto, surge um problema para a explicação de Frege, pois a imutabilidade da verdade dos pensamentos não parece condizer com a mutabilidade de inúmeras verdades além de conduzir a um tipo de fatalismo. Poderíamos perguntar: a que verdades imutáveis corresponderiam os pensamentos "Eu não vou sair amanhã" ou mesmo "Tirei notas baixas em inglês"? No primeiro caso, se admitirmos que a verdade do pensamento já "estava lá", somos obrigados a admitir uma forma de fatalismo, em que temos um destino determinado. No segundo caso, não sabemos explicar a relação desse mundo metafísico e imutável com o nosso mundo, pois as minhas notas ruins representam uma verdade contingente e mutável, embora tenha uma contraparte metafísica necessária e imutável. Frege responde à segunda objeção fazendo distinções metafísicas entre as partes mais essenciais e menos essenciais do pensamento; as partes menos essenciais captariam a mudança das coisas. Trata-se, contudo, de uma solução artificiosa.
É surpreendente que tivemos que esperar até 2002 por uma tradução dessas obras. E mais surpreendente ainda é que a tradução dessas obras não se dê por meio de uma grande editora, mas em uma pequena coleção de livros de filosofia de menor expressão. Ao procurar por outras obras de Frege traduzidas para o português só encontrei dois livros: uma coletânea de artigos intitulada Lógica e Filosofia da Linguagem (Editora Cultrix) e excertos de duas obras: Sobre a Justificação Científica de uma Conceitografia e Os Fundamentos da Aritmética (Nova Cultural). A primeira é uma excelente coletânea de alguns dos principais artigos de Frege, também traduzida e organizada por Paulo Alcoforado, mas que infelizmente está esgotada há muito tempo, sua última edição foi em 1978. A segunda resulta de excertos selecionados e traduzidos por Luís Henrique dos Santos, na já conhecida coleção Os Pensadores.
Alguém poderia objetar que ignoro a política das grandes editoras, segundo a qual o que importa é a quantidade de livros a serem vendidos e não a qualidade desses livros. O problema dessa linha de raciocínio é que mesmo nesse sentido as obras de Frege constituem um sucesso editorial garantido. Sabemos que as traduções dos clássicos são sempre promissoras para as editoras: para citar dois exemplos no Brasil basta lembrar de clássicos como O Tratado da Natureza Humana, de David Hume (UNESP), que já se encontra esgotada e todos os livros da já mencionada coleção Os Pensadores (Nova Cultural), que continua a ser reeditada ao longo dos anos e é presença constante entre os alunos de filosofia. Essas razões, por si mesmas, deveriam ser suficientes para demonstrar que a tradução de clássicos é vantajosa não só para as editoras, mas para todos.
Este livrinho tem vários méritos, sendo um deles a forma de escrita. Frege, ao contrário dos pensadores obscuros, tem uma prosa clara e de modo cortês convida o leitor a avaliar a força de suas idéias diretamente, sem peias, a cada página. Trata-se de uma oportunidade intelectual ímpar, típica dos clássicos. Uma leitura obrigatória para quem aprecia o que há de melhor na filosofia.
Matheus Silva
Universidade Federal de Ouro Preto

62) O mundo não respeita a lógica?

Não digo o mundo, mas a subversão (i)lógica anda bastante difundida. Até mesmo em certos ambientes acadêmicos dorme a razão um sono profundo, proliferando-se os monstros a difundir impropérios e ilogicismos. Goya há muito já nos alertara.

Vinícius Portella

Porto Alegre,
19 1754 mar 2010.

Matheus Silva
Universidade Federal de Ouro Preto
Um dos argumentos utilizados por subjetivistas é a de que o mundo não tem que respeitar as leis da lógica, que não passariam de convenções humanas. O jovem Nietzsche em carta a um amigo é um exemplo deste modo de pensar: "Meu caro, as visões da vida não são criadas nem anuladas pela lógica! Eu me encontro bem nestes ares, tu em outros. Respeita o meu nariz como eu respeito o teu!". O problema dessa argumentação é que ela resulta de uma incompreensão do que é a lógica. Mas o que é a lógica?
A lógica consiste no estudo e sistematização da argumentação correta. Entre outras coisas, a lógica nos permite distinguir os argumentos corretos dos incorretos e perceber porque razões um argumento é correto ou incorreto. Mas por que razão é importante argumentar? Porque um dos principais meios de descobrirmos a verdade e distingui-la de ilusões é argumentar e justificar nossas idéias; por isso a lógica é tão importante. Argumentamos o tempo todo, fazemos ilações de todos os tipos entre diversas coisas, não só na atividade filosófica, mas também no dia-a-dia: seja um empresário que pretende tomar uma decisão importante, um político que pretende convencer o eleitorado ou um filho que pede aumento de mesada ao pai, todos se utilizam da lógica.
Agora que já explicamos o objeto de estudo da lógica e sua importância, podemos entender o equívoco das afirmações de Nietzsche. A lógica não é independente do mundo. A lógica trabalha com relações de valores de verdade, mas o que determina os valores de verdade e as relações entre eles é o mundo, não é a lógica. A lógica apenas exprime essas verdades. Um argumento em que as premissas podem ser verdadeiras e a conclusão falsa é inválido, não porque assim desejamos, mas porque as circunstâncias efetivas do mundo assim o determinam. Tomemos um exemplo de argumento inválido:
Se Deus criou o mundo há seres vivos organizados.
Há seres vivos organizados.
Portanto, Deus criou o mundo.
O argumento é inválido porque a conclusão não se segue das premissas. De fato, há seres vivos organizados, mas isso não implica em dizer que Deus criou o mundo. Poderiam existir outras causas para os seres vivos, causas físico-químicas, por exemplo. Por um lado, podemos saber pela forma lógica que o argumento é inválido, pois a conclusão não se segue das premissas; por outro lado, podemos constatar que a segunda premissa é verdadeira verificando na própria realidade o seu valor de verdade: realmente há seres vivos organizados. Mas mesmo que admitíssemos a primeira premissa como verdadeira, o que é questionável, isso não nos permitiria concluir que Deus criou o mundo; e nada que eu pudesse dizer em contrário mudaria esse simples fato, porque as circunstâncias efetivas do mundo são tais que a conclusão não se seguirá das premissas.
Já o fato de ser impossível que um argumento válido contenha premissas verdadeiras e a conclusão falsa o é não porque exista uma lei da lógica convencionada que assim determina, mas porque o mundo é tal que torna impossível o contrário. Tomemos um exemplo de argumento válido:
As pessoas que estudam lógica têm uma boa preparação filosófica.
O João estuda lógica.
Logo, o João tem uma boa preparação filosófica.
O argumento é válido porque seria impossível que as premissas fossem verdadeiras e a conclusão falsa, uma vez que sua estrutura lógica determina que a verdade dessas premissas implica a verdade da conclusão. Se de fato as pessoas que estudam lógica têm uma boa preparação filosófica e o João é uma dessas pessoas, necessariamente ele terá uma boa preparação filosófica. Sendo as premissas verdadeiras a conclusão não pode ser falsa, e por mais que insistisse em dizer o contrário o mundo não vai se modificar por isso.
Na verdade, quando se diz que algo é uma impossibilidade lógica o que se quer mostrar é que o mundo é tal que torna algumas coisas impossíveis, e podemos saber disso recorrendo apenas à lógica e ao significado dos termos. Por exemplo, tomemos a seguinte afirmação:
Deus existe e não existe.
O mundo é tal que torna impossível — logicamente impossível — que Deus exista e não exista, visto que é uma mera verdade lógica que nada pode existir e não existir. Essa proposição se contradiz a si mesma porque afirma e nega o mesmo fato: afirma que Deus existe e simultaneamente afirma que Deus não existe. Podemos dizer que isso é impossível por efeito do modo como o mundo é. Portanto se uma afirmação descreve algo logicamente impossível essa afirmação descreve algo impossível ou necessariamente falso.
É claro que podemos dizer que há verdades que não são verdades lógicas, mas de outra espécie, como por exemplo:
A água é H2O.
Curvelo é uma pequena cidade do interior de Minas Gerais.
A primeira afirmação é uma verdade química ao passo que a segunda afirmação é uma verdade meramente geográfica, mas não há nada nessas afirmações que seja inquietante ou problemático para as pretensões da lógica. São verdades que escapam ao domínio da lógica, mas isso não implica em dizer que essas verdades violam a lógica. É necessário que isso fique bem claro, pois muitas pessoas partilham da noção equivocada de que ou admitimos a lógica como um instrumento para se chegar a verdades ou a consideramos irrelevante. Mas é claro que essa forma de pensar é um falso dilema: a lógica não é o único instrumento para se chegar à verdade. Se não fôssemos capazes de ver o mundo à nossa volta como poderíamos, na imensa maioria das vezes, saber se uma afirmação é verdadeira ou falsa? A experiência também é uma importante fonte de verdade.
Sem recorrer à experiência grandes cientistas como Galileu não teriam feito qualquer descoberta. Contudo, a lógica não se faz menos importante por isso, como diz o próprio Galileu: "O número de pessoas que raciocinam bem em questões complicadas é muito menor do que o daquelas que raciocinam mal". Ora, se a lógica nos permite distinguir a boa argumentação da má argumentação, se com a lógica podemos raciocinar de modo mais rigoroso, por que razão deveria ela ser descartada como uma ferramenta inútil ou de pouco valor? Ao invés, constitui um instrumento dos mais importantes.
A lógica é tão necessária que sequer podemos argumentar de modo satisfatório contra ela mesma sem utilizá-la e conhecê-la. Em resposta a um interlocutor que desafiou Epicteto a demonstrar o valor da lógica, este último argumentou da seguinte forma:
"Queres que te prove isso?" A resposta foi "Sim". "Então tenho de usar uma forma demonstrativa de discurso". O interlocutor aceitou. "Como saberás então se te estou a enganar com um sofisma?" E quando o homem ficou em silêncio, Epicteto disse: "Estás a ver? Tu próprio admites que a lógica é necessária, pois sem ela nem podes determinar se a lógica é necessária ou não". (Epicteto, Discursos,Livro 2, cap. 25)
O que o argumento demonstra é que mesmo que queiramos saber se os argumentos que pretendem demonstrar a necessidade da lógica são sólidos, temos de usar a própria lógica.
Outro ponto interessante são as motivações psicológicas dos opositores da lógica. Geralmente o que se verifica é que os adversários da lógica têm algo a perder se admitirem o papel regulador da lógica: seja porque possuem crenças que apesar de emocionalmente reconfortantes são absurdamente contraditórias, seja por serem incapazes de justificar racionalmente suas crenças. São essas motivações espúrias, completamente alheias à lógica, que levam esses opositores a rejeitarem o raciocínio correto. Na verdade, eles sabem em que prateleira deve se colocar a lógica sem nada conhecer da mesma, exceto que esta representa um perigo para a suas crenças. Se dissermos que a lógica é um instrumento inútil que não merece ser levado a sério, qual é o próximo passo? Dizer que a procura da verdade não precisa mais ser pautada pela discussão pública e aberta das idéias; afinal, haveria muitas verdades que escapam ao domínio da lógica e da racionalidade. É por isso que seus críticos freqüentemente afirmam que a lógica é demasiado castradora e fria, como diz Nietzsche: "a lógica escraviza a linguagem".
Qualquer pessoa que tenha estudado lógica seriamente sabe que há algo de errado nesse modo de pensar; há muitas pressuposições como, por exemplo, a de que a lógica eliminaria modos de expressão como a poesia, as metáforas, etc. Bom, para ser breve: uma das características da lógica é a criatividade. Poderia citar inúmeras razões sendo uma delas o fato de que estudar lógica exige pensar em possibilidades diferentes e circunstâncias novas ao avaliar os diferentes argumentos — o método dos contra-exemplos e dos mundos possíveis é um perfeito exemplo disso. A lógica também não elimina a poesia nem proíbe metáforas, mas apenas avalia e diferencia a boa argumentação da má argumentação em qualquer lugar que esta se encontre: na literatura, na filosofia ou na ciência.
Também se diz freqüentemente que a lógica é muito limitada por se basear em três princípios: a identidade, a não-contradição e o terceiro excluído. A realidade, diz esses críticos, é muito complexa para ser compreendida por esses princípios. Esse último argumento, mais do que os anteriores, demonstra uma enorme ignorância, pois várias lógicas modernas violam essas leis. As lógicas intuicionistas, por exemplo, abandonaram o princípio do terceiro excluído. A lógica não é uma disciplina pronta e acabada, mas levanta diversos problemas filosóficos que estão na ordem do dia. Mas essas são conclusões que só quem se deu ao trabalho de estudar a lógica está em condições de afirmar e é claro que tais críticos não estão interessados em saber verdadeiramente o que é a lógica. Na verdade o que realmente querem dizer com "a lógica é castradora", é que a lógica disciplina o pensamento, além de inviabilizar idéias ambíguas, contraditórias e infantis. Mais uma vez, só mesmo as pessoas interessadas em devaneios rebuscados e elucubrações sem fundamento sentem a necessidade de afirmar que são em demasia "limitadas" pela lógica. Um pensamento rigoroso e preciso é um veneno para esse modo de pensar.
Por fim, devemos pedir a esses opositores que sejam ao menos conseqüentes com suas idéias. Afinal, a filosofia é uma disciplina essencialmente dialética que procede por meio de argumentos e contra argumentos. A atividade filosófica se preocupa em responder questões tão fundamentais que só muito raramente a experiência pode resolvê-las e não temos outros instrumentos a não ser a avaliação crítica dos diferentes argumentos, suas objeções, contra-exemplos, etc. De fato, o raciocínio lógico desempenha um papel tão indispensável e proeminente na filosofia que torna inacreditável a postura de alguém que insiste em permanecer na atividade filosófica apesar de negar esses mesmos princípios. Os que negam a lógica negam também a filosofia, além de abrir espaço para um relativismo castrador, pois não podemos considerar seriamente as questões filosóficas se o "nariz" do outro é o critério de verdade, como disse o jovem Nietszche na carta.

61) Recomendação de Hayek aos Mais Jovens.

“Por favor, não se tornem hayekianos, pois cheguei à conclusão que os keynesianos são muito piores que Keynes e os marxistas bem piores que Marx”.

(Recomendação feita a jovens estudantes de economia, admiradores de sua obra, num jantar em Londres, em 1985.)

60) Convite à Filosofia: do quadrado das oposições e de certos deslizes.


Por favor, não me façam um convite desses.

Vinícius Portella

Porto Alegre,
19 1719 mar 2010.

Contrárias e subcontrárias na lógica aristotélica

Dídimo Matos
Em artigo do Jornal Opção, um jornal goiano que circula em Brasília, o professor da Universidade Federal de Goiás, Gonçalo Armijos Palacius, analisa o livro de Ensino Médio Convite à Filosofia escrito pela professora da Universidade de São Paulo, Marilena Chauí. Nesta análise o professor goiano percebe no livro da uspiana um extenso conjunto de erros, que vão desde falta de fidelidade ao texto original de autores consagrados como Platão e Marx, até falhas conceituais sérias, caso das cometidas no capítulo sobre lógica que iremos analisar.
O professor Armijos enumera vários problemas no capítulo designado "Elementos de Lógica", que se inicia na página 183 do referido livro. Dos diversos erros, nos deteremos especificamente em um. Armijos nos informa e podemos verificar no livro que a professora de São Paulo afirma que num quadrado das oposições — instrumento lógico desenvolvido na Idade Média a partir das idéias do Órganon aristotélico – podemos nominar de contrárias tanto a relação entre proposições universais afirmativas e negativas, quanto a relação entre proposições particulares afirmativas e negativas (Chauí, 2002, p. 186).
Detectado esse problema, Armijos argumenta que existe uma diferença entre elas; as relações no quadrado das oposições; e, que se definem da seguinte forma: a relação entre universais afirmativas e negativas se chama "contrária" e, entre particulares se chama "subcontrária". Informa-nos, ainda, que essa distinção não é sem sentido, mas que se baseia no fato de que as proposições contrárias podem ser ambas falsas, mas não podem ser ambas verdadeiras. Enquanto que, as subcontrárias podem ser ambas verdadeiras, mas não podem ser ambas falsas.
Concordamos com o professor Armijos que o erro é claro no trabalho de Marilena Chauí, e que pelo número de erros que o sobredito livro possui já deveria ter saído de nossas estantes e bibliotecas, ao ponto de recomendarmos a leitura da série de textos, que se encontra disponível na Internet, a todos os que porventura tenham um mínimo de curiosidade em relação a um trabalho filosófico levado a cabo com a maior seriedade.
Entretanto, é preciso ainda, levar em consideração um aspecto que foi esquecido pelo professor Gonçalo Armijos. Para evidenciar esse aspecto vejamos o Quadrado das Oposições. Neste quadrado percebemos que existem letras que representam as proposições, sendo:
Quadrado de Oposição
Quadrado de Oposição
A — proposições universais afirmativas, exemplo: Todo homem é mortal;
E — proposições universais negativas, exemplo: Nenhum homem é mortal;
I — particulares afirmativas, exemplo: Alguns homens são mortais;
O — particulares negativas, exemplo: Alguns homens não mortais.
Entre as proposições existem relações que são evidenciadas na figura, que são a de contrariedade, de subalternidade, de contraditoriedade e de subcontrariedade, entendamos cada uma:
A relação de contrariedade se dá entre uma proposição universal afirmativa e uma negativa;
A relação de subcontrariedade se dá entre uma proposição particular afirmativa e uma particular negativa;
A relação de subalternidade se dá entre uma proposição universal afirmativa e uma particular também afirmativa ou entre uma universal negativa e uma particular negativa;
A relação de contraditoriedade se dá entre uma proposição universal afirmativa e uma particular negativa ou entre uma universal negativa e uma particular afirmativa.
As relações que examinaremos são as contrárias e subcontrárias.
Pela afirmação do professor Armijos, o que diferencia subcontrárias e contrárias é o fato de que as primeiras podem ser ambas verdadeiras, mas não podem ser ambas falsas e as segundas podem ser ambas falsas, mas não podem ser ambas verdadeiras. Entretanto, há uma ressalva importante a ser feita, que é a de que essa distinção só é válida para classes que não sejam vazias.
Uma afirmação do tipo "Todo homem é mortal", insere a classe dos homens na classe dos mortais, uma frase do tipo "Nenhum homem é mortal", retira da classe dos mortais a classe dos homens; essas proposições são universais porque tratam do total de elementos da classe a que se referem, as particulares se diferenciam por tratar apenas de parte dessas classes.
Se uma classe é vazia, as proposições contrárias são ambas verdadeiras, assim, "todo o saci tem uma perna" e "nenhum saci tem uma perna" são ambas verdadeiras e as respectivas particulares, que são subcontrárias, são ambas falsas.
Para demonstrá-lo vejamos o seguinte, uma proposição particular afirmativa é contraditória em relação a uma universal negativa, como já vimos. Dado o fato de que numa relação de contraditoriedade se uma proposição tem valor de verdade V, sua contraditória terá obrigatoriamente valor de verdade F, e vice-versa, à frase "Algum saci tem um pé" — que quer dizer em bom português que pelo menos um saci tem um pé — não pode ser verdade pois não existem sacis. Assim, essa proposição é falsa e, portanto, sua contraditória "Nenhum saci tem um pé" é verdadeira. O mesmo raciocínio vale para o caso "Algum saci não tem um pé", que é falsa pelo mesmo fato de que não existem sacis, e assim, "Todo saci tem um pé" é também verdadeira.
Desta forma, apesar de concordarmos que as proposições contrárias e subcontrárias se diferenciam pelos motivos apontados pelo Professor Gonçalo Armijos e que a Professora Chauí está errada, acreditamos que é necessário que o aspecto levantado no presente texto seja levado em consideração.

quinta-feira, 18 de março de 2010

59) Perguntas Mais Frequentes do Candidato à Carreira Diplomática Brasileira.

Do Diplomatizzando para O Arqueiro Prudente...


VP


Porto Alegre,
18 2351 mar 2010.
.................................


Meu colega Renato Godinho, atualmente residindo em Roma, preparou essas "Perguntas mais frequentes" sobre a carreira diplomatica varios anos atras, mas elas ainda parecem uteis, com alguns ajustes inevitaveis.
Os links e enderecos eventualmente constantes podem ja nao funcionar mais, mas o resto permanece largamente verdadeiro (e divertido).
Transcrevo novamente aqui pois se trata de um dos posts mais acessados em um antigo blog meu, eventualmente com problemas de linkagem...
Divirtam-se, candidatos.
Paulo Roberto de Almeida (de Shanghai, 12.03.2010)

FAQ do Candidato a Diplomata
por Renato Domith Godinho

TEMAS: Concurso do Instituto Rio Branco, Itamaraty, Carreira Diplomática, MRE, Diplomata, Diplomacia, Ministério das Relações Exteriores, Relações Internacionais, Concurso público, Política Externa.
Atualizada em: 27/04/06

Só reproduza na íntegra.

Apresentação
O público-alvo desta FAQ são aquelas pessoas que estão prestando, pretendem prestar ou estão meramente pensando em prestar o Concurso para Admissão à Carreira de Diplomata, vulgo concurso do Instituto Rio Branco. Não existe, que eu saiba, nada parecido disponível na internet. O interesse pela carreira e pelo concurso é muito grande e crescente, enquanto a informação disponível, de forma centralizada e organizada, é escassa.
Resolvi escrever esta FAQ depois de receber o enésimo pedido de informações sobre o concurso e a carreira. Não sei se por causa da ascensão de temas de política externa no interesse da opinião pública, por causa da situação morna da economia privada nos últimos anos ou simplesmente por efeito da minha faixa etária, de repente parece que todo amigo meu tem um amigo que quer prestar o concurso, isso quando não o querem meus próprios amigos. Ao invés de gastar meu tempo respondendo vezes sem conta às mesmas perguntas e ajudar — se é que ajudo — a uns poucos, melhor seria, pensei, se trabalhasse em um texto que respondesse de uma só vez à maior parte das perguntas que recebo e o pusesse na internet, ajudando — ou não ajudando — a todos os que quiserem ler.
Esta FAQ representa, naturalmente, a opinião pessoal do autor, e não tem qualquer vínculo com o Ministério das Relações Exteriores, o Instituto Rio Branco, o governo brasileiro ou qualquer outra instituição pública ou privada. Não se pretende, tampouco, uma resposta definitiva a quaisquer das perguntas abaixo listadas. O concurso está sempre mudando; poucos anos no Ministério, acompanhando mais ou menos de perto o tema, bastaram para convencer-me disso. Sai francês, entra francês, muda o sistema de correção de testes, desaparecem as provas orais, altera-se o peso relativo das matérias, evoluem os critérios das bancas examinadoras... Nos últimos três anos, cada concurso realizado teve certas regras e características únicas. Embora esta FAQ ainda se aplique muito bem ao concurso de hoje, nada garante que poderá aplicar-se bem ao de amanhã.
Sei bem, ainda, que esta FAQ está longe de ser completa. Por sorte, também não a considero acabada. Se você tem uma pergunta que não está relacionada aqui, e crê que uma resposta possa ser do interesse geral, ficarei muito grato se ma enviasse por emeio, que procurarei responder nesta página. Se não anoto meu endereço aqui, é para me proteger dos farejadores automáticos das listas de spam. Mas você pode encontrar um link na página principal deste site. Ou escreva para renatogodinho em uol ponto com ponto br.

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Esta FAQ é pública e de uso livre. Seu objetivo foi o de reunir o máximo de respostas em um só lugar conveniente. Além disso, esta FAQ não é estática, pois pretendo ampliá-la e revisá-la regularmente. Por isso, a única condição imposta a seu uso é que qualquer reprodução desta FAQ deverá ser feita integralmente, contendo inclusive um link para esta página, que trará sempre a versão mais atual.

Índice de perguntas
Apresentação
Condições de uso
O Concurso do Instituto Rio Branco
O concurso em si
O que é o concurso do Instituto Rio Branco?
Onde posso obter informações sobre o concurso?
Que história é essa de inglês não ser mais obrigatório?
Preciso saber falar francês?
Quais são os requisitos para passar no concurso?
Eu tenho dupla nacionalidade. Serei aceito no concurso?
Estudando para o concurso
Quanto tempo devo estudar?
Preciso ler toda a bibliografia listada no Guia de Estudo?
Que matérias devo priorizar nos meus estudos?
É possível passar estudando só as apostilas da Funag?
Que livros você recomenda que eu estude?
Você tem alguma dica para a hora de estudar?
Você tem alguma dica para a hora de fazer as provas?
Cursos preparatórios
Devo fazer um curso preparatório?
O que é melhor? Fazer um curso completo ou contratar professores particulares individualmente?
Quais são os cursos preparatórios disponíveis em minha cidade?
Que curso você recomenda?
O Instituto Rio Branco
Quanto tempo dura o curso do Rio Branco? (PROFA-I)
Eu ganharei uma bolsa durante o curso?
Há aulas de línguas?
Quais são as matérias estudadas?
Como assim, “Mestrado em Diplomacia”?
Como foi, pra você, estudar no Rio Branco?
Você gostou das aulas?
É possível ser reprovado?
Poderei, durante o Rio Branco ou depois dele, exercer alguma outra atividade remunerada na iniciativa privada?
E haverá tempo disponível para isso?
Durante o curso, há quantos meses de férias por ano?
Terei um estágio no exterior ao fim do Rio Branco? Por quanto tempo?
E o PROFA-II?
Carreira diplomática
O que “faz” um diplomata?
Qual a diferença entre embaixada e consulado? O diplomata trabalha nos dois?
Como é o dia a dia de um diplomata?
Tá bom, como é o dia-a-dia de um diplomata quando no Brasil?
E no exterior?
Qual é o “perfil” para ser diplomata?
Quanto tempo se passa no exterior?
Se eu não quiser, serei obrigado a me mudar para um determinado país?
Como é, então, que escolho os países onde vou servir?
Como é a hierarquia da carreira?
Se virar diplomata, vou chegar a ser embaixador? Quando?
Quanto ganha um diplomata?
Como ficam o cônjuge e os filhos quando o diplomata vai morar no exterior?
Outros temas
Quem é você?
Quando ingressamos no Rio Branco, o Itamaraty nos providencia residência em Brasília?
O MRE fornece alguma passagem aérea para minha cidade natal, periodicamente, ou sempre que quiser visitar meus familiares terei de arcar com as despesas de passagem?
Posso usar tatuagem?
Há uma idade máxima, ou "certa", para entrar na carreira?

O Concurso do Instituto Rio Branco
O concurso em si
O que é o concurso do Instituto Rio Branco?
Hoje, o Concurso para Admissão à Carreira de Diplomata (CACD) é ao mesmo tempo um vestibular para uma instituição pública de ensino profissional, o Instituto Rio Branco (IRBr), e um concurso público federal, em que os aprovados tomam posse em um cargo de funcionários públicos federais da carreira de diplomata. Quem é aprovado neste que é um dos concursos mais concorridos do país ingressa ao mesmo tempo no curso do IRBr e na carreira, no grau hierárquico de Terceiro Secretário. Ganha o salário integral de um diplomata em início de carreira, mas não começa a trabalhar de fato senão após concluir o curso, que costuma durar dois anos.
Nem sempre foi assim. Até 1990 e poucos, só se ingressava na carreira depois de concluído o Rio Branco. Os alunos do instituto contavam para seu sustento apenas com uma relativamente magra bolsa de estudos. A vida de um riobranquino hoje é bem mais feliz, ou, pelo menos, mais opulenta.
Onde posso obter informações sobre o concurso?
A primeira coisa a fazer é visitar a página do Instituto Rio Branco, que traz informações sobre a carreira. Lá também tem um link para o edital do concurso e para o Guia de Estudos. O Guia é uma publicação anual do Instituto. Ele fornece o importantíssimo programa de cada matéria que cai na prova. Lá você também encontrará a bibliografia recomendada, dicas de estudo, exemplos de questões de anos anteriores e outras informações úteis. É mais importante até, acredite, do que esta FAQ. Outro bom passeio é visitar um dos escritórios regionais do Itamaraty, se houver um em sua cidade, ou o próprio Itamaraty, se você está em Brasília. Então você encontrará impresso aquele mesmo Guia de Estudos em forma de livrinho, o que é muito mais conveniente do que baixá-lo da internet, poderá conversar com as pessoas (no meu tempo de estudo os diplomatas do Escritório em São Paulo, no Memorial da América Latina, eram muito legais, e gostavam de prosear com candidatos. Talvez ainda gostem) e, finalmente, conferir as publicações da Funag.
Que história é essa de inglês não ser mais obrigatório?
Não é exatamente verdade. A prova de inglês sempre foi e continuará sendo obrigatória. Aconteceu, porém, que, desde 2005, ela deixou de ser eliminatória. E não foi só ela. TODAS as provas após a primeira fase deixaram de ser eliminatórias, exceto a de português.
Antigamente, toda prova era eliminatória, o que significava que era necessário obter a nota mínima em todas. O resultado, no final da maratona, era que quase sempre acabavam entrando menos aprovados que vagas. Fazia bem para a imagem de “mau” do concurso, mas no meu entender era um desperdício. Se precisamos contratar 30 diplomatas, por que admitir só 27? Uma deficiência em uma matéria poderia ser amplamente compensada pela eficiência nas outras.
Com a mudança, não deverão mais sobrar vagas, e as pessoas vão ter de competir umas contra as outras, ao invés de competir contra as notas mínimas. A ordem de classificação é que vai determinar quem fica e quem volta pra casa. Por exemplo, se 150 pessoas passarem na prova (eliminatória) de português, mas só houver 50 vagas naquele ano, os aprovados serão os que obtiverem as 50 melhores médias em todas as provas.
Em outras palavras: quem zerar ou tirar nota muito baixa em inglês, ou em outra prova qualquer, não passará no concurso de qualquer forma, simplesmente porque outros candidatos terão médias melhores. É por isso que achei um exagero toda a polêmica criada na imprensa em torno da mudança. É verdade que, em um concurso com 100 vagas, é possível que alguém possa ser aprovado com uma baixa média em inglês, desde que compense nas outras. Mas não há de ser nada que não possa ser sanado — as aulas de inglês que tive no Instituto Rio Branco foram muito boas — bem acima da média peculiar a essa insigne instituição.
Preciso saber falar francês?
Não. No meu ano o concurso sequer tinha prova de francês. Agora ela voltou e, ainda que não seja eliminatória, algum francês vai ajudar a fazer a diferença em relação a outros candidatos. Fora isso, já se foi o tempo em que o francês era a língua diplomática oficial. Hoje, se há um idioma oficial da diplomacia, é o inglês. Francês ajuda, principalmente se você for trabalhar um dia em um país francófono, mas não é mais essencial como foi no passado. O espanhol é hoje muito mais útil para um diplomata brasileiro, uma vez que estamos cercados de países de fala hispânica com os quais mantemos relações importantes.
Quais são os requisitos para passar no concurso?
Legalmente, é preciso ser brasileiro nato, estar em dia com as obrigações eleitorais e de serviço militar, ter a ficha limpa na polícia e ser formado em um curso superior reconhecido no Brasil pelo Ministério da Educação (MEC). Qualquer curso superior. Apesar de mais ou menos metade dos aprovados no concurso serem via de regra formados em direito, e muitos outros em relações internacionais, conheço diplomatas formados em engenharia, medicina, letras e ciência da computação. Eu mesmo sou formado em jornalismo. Diplomas estrangeiros, só se reconhecidos pelo MEC.
Já na prática, para passar no concurso exige-se um domínio bastante razoável do programa previsto para as provas; boa capacidade de raciocínio e principalmente de escrita; bom nível em inglês. Já disse que esse concurso tem fama de ser um dos mais difíceis do país. É bem mais difícil do que ser aprovado em um vestibular concorrido, como o da Fuvest; é bem mais fácil do que compor uma boa sinfonia em quatro movimentos ou projetar a nova geração de CPUs. Talvez seja mais fácil que ser aprovado nos mais concorridos trainees para gerência de multinacionais no Brasil.
Espero não ter que ressalvar que, apesar de tudo o que disse acima, fácil e difícil são conceitos relativos; o que é fácil para um pode ser muito difícil para outro, e vice-versa.
Eu tenho dupla nacionalidade. Serei aceito no concurso?
A Constituição reza que, exceto as exceções, quem pede para ser naturalizado como nacional de outro país perde a identidade brasileira. No entanto, já ficou estabelecido que, em boa parte dos casos em que um brasileiro tem uma nacionalidade estrangeira, não foi ele que pediu uma outra nacionalidade — a dupla nacionalidade é apenas reconhecida, segundo as leis próprias do país estrangeiro, e portanto não há perda da nacionalidade brasileira. Assim sendo, não há obstáculos ao ingresso desses seres cosmopolitas no concurso. E não, não vão suspeitar que você é um agente duplo trabalhando para vender o Brasil para a Itália. Só tem uma coisa: a Lei do Serviço Exterior afirma que, para casar-se com estrangeiros, os diplomatas precisam da autorização do Ministro de Estado.
Estudando para o concurso
Quanto tempo devo estudar?
Você espera mesmo que eu responda a isso? Esqueça. Há pessoas que estudam por meia década até passarem. Outras (raríssimas, admito) não estudam quase nada. Eu fiz seis meses de um curso preparatório com aulas cinco vezes por semana, todas as noites, comparecendo às aulas, e lendo, com vagar, os livros mais interessantes da bibliografia. Não podia fazer mais porque, afinal, tinha que trabalhar e cuidar de que minha namorada não me largasse. Já na reta final, a seis semanas das provas da terceira fase, as que eu mais temia, larguei tanto o cursinho quanto o emprego e estudei intensamente, sozinho, oito horas por dia, sublinhando (ugh!) fazendo fichamentos (argh!) e tudo mais. Funcionou, para mim.
Cada um deverá encontrar a fórmula que melhor lhe convier. É importante ter consciência do grau de conhecimento necessário e das próprias deficiências localizadas.
Preciso ler toda a bibliografia listada no Guia de Estudo?
Não. Deixe-me dizer isso de novo. Não. Não desperdice seu tempo esgotando a lista pretensiosa, redundante e por vezes desnecessária que costumam publicar no Guia. Não quero dizer com isso que não haja obras importantes arroladas lá. Pelo contrário: a maior parte do que você vai precisar estará lá. Porém, priorize as disciplinas e, dentro delas, selecione as obras mais proveitosas. Evite as excessivamente especializadas.
Por outro lado, se você puder, não tenha medo de gastar dinheiro com livros. Construa uma pequena biblioteca pessoal. Eu, particularmente, nunca gostei de ler em bibliotecas, e acho chato ficar pegando títulos emprestado e pedindo renovação constantemente. Eu gastei mais de mil reais, se me lembro bem. Compre o que der em bons sebos e o resto nas livrarias. Você estará comprando bons livros, que lhe serão proveitosos mesmo na hipótese de você não passar. Evite estudar uma pilha de xerox mal encadernados. Ler em livros é muito mais cômodo e tem menos cara de “estudo”. Se vai ter que passar um bom tempo estudando para o concurso, é bom tornar a experiência o mais agradável possível.
Que matérias devo priorizar nos meus estudos?
Inglês é fundamental. Não basta um inglês desses de CCAA. O nível da prova é altíssimo, a exigência é que se escreva um inglês correto de verdade, um inglês que o norte-americano médio provavelmente não alcançaria. Português também, e é ainda mais complicado, pois a banca é exigente e idiossincrática. Se a primeira fase é a que quantitativamente mais elimina, a prova de português talvez seja a mais terrível. Como Parcas munidas de canetas vermelhas, a inescrutável Banca Corretora parece determinar às cegas quem vai passar e quem não vai, por melhor que seja o vernáculo praticado pelos pobres mortais em seu poder. Seu julgamento, porém, não é tão arbitrário. Na verdade, o importante é aprender o português DELA, da banca. Um português todo quadrado, certinho, virgulado, objetivo e sem firulas. Há muita má vontade contra o excesso de zelo da banca de português, inclusive de minha parte, mas às vezes penso que, no fundo, ela pode ter razão. Ou não.
Afora isso, as provas de História e de Política Internacional (antes “Questões Internacionais Contemporâneas”) são as mais importantes em termos de conteúdo. E, por fim, apesar de menos exigentes, não se pode ignorar as provas de Economia, Direito (internacional e administrativo) e Geografia.
É possível passar estudando só as apostilas da Funag?
Não. Para quem não sabe, a Funag é a editora do Ministério das Relações Exteriores (MRE). Ela publica apostilas chamadas "Manual do Candidato", uma para cada matéria da prova. Português, História, Geografia, etc. Considere-as um ponto de partida, um porto seguro que lhe dará uma idéia do tipo de conteúdo abrangido pelas provas. Não é suficiente estudar só nelas, vai ser preciso correr atrás dos livros. As apostilas da Funag podem ser adquiridas nos Escritórios Regionais do Itamaraty, em algumas livrarias especializadas e na própria Funag, na sede do MRE ou em sua loja virtual na internet.
Que livros você recomenda que eu estude?
Posso recomendar alguns que eu usei e gostei. Você faria muito bem se cruzasse algumas outras listas, porque a utilidade dos livros deve variar de acordo com o conhecimento que cada um já tem das matérias. Aí vão, por disciplina:
História: História do Brasil, Boris Fausto, Edusp. Para história da diplomacia no Brasil, temos o incontornável História da Política Exterior do Brasil, Amado Cervo e Clodoaldo Bueno, Editora da UnB. Para história geral, o melhor é ler os quatro livros de Eric Hobsbawm, historiador cuja feiúra só é comparável à sua onisciência: Era das Revoluções, Era do Capital, Era dos Impérios e Era dos Extremos. Apesar de serem boas as edições da Companhia das Letras, aproveite e compre-os em inglês, na Livraria Cultura ou em bons sebos, para treinar também a leitura no idioma. Complete-os, porém, com a leitura de um bom livro texto de História Geral, mais resumido. O livro Diplomacy, de Henry Kissinger, mais focado em alta política internacional, também é uma boa pedida. Também sugiro lê-lo em inglês.
Geografia: por incrível que pareça, o melhor a fazer nessa matéria é deixar de lado a maior parte da bibliografia recomendada e estudar em livros de geografia do 2º grau. É muito bom o de Demétrio Magnolli e Regina Araújo. Chama-se Projetos de Ensino de Geografia, e tem dois volumes: Geografia do Brasil e Geografia Geral. A apostila de geografia da Funag é baseada nesse livro, mas o livro é muito melhor.
Economia: Economia Brasileira Contemporânea, vários autores, Ed. Atlas. O livro é excelente, cobre história econômica do Brasil, macroeconomia, microeconomia, contas nacionais, história do pensamento econômico, tudo. E é muito fácil de entender, comparado com outros manuais que existem por aí (desconfiem do chamado “manual dos professores da USP”! Para não-economistas, é grego). O livro clássico de Celso Furtado, Formação Econômia do Brasil, além de também ser muito bom e muito claro, serve também para a prova de história.
Política Internacional (ex-Questões Internacionais Contemporâneas): para esta disciplina é mais difícil arrumar um livro de base. O conteúdo é disperso e fica rapidamente ultrapassado. Um ponto de partida é o manual da Funag. Há também os livros que estão na bibliografia do Guia de Estudos. Mas o negócio é ficar atualizado, ler artigos e revistas sobre Alca (que, aliás, já era), Mercosul, EUA, etc. etc. Tem um site chamado RelNet (www.relnet.com.br) que é bem bacana. Lá você pode fazer um cadastro e receber por email boletins diários com uma coletânea de notícias de jornais do Brasil e do mundo sobre esses temas. No próprio site tem um monte de artigos que vale a pena ler.
Direito: Um livro muito bom é o Curso de Direito Internacional Público, Guido Soares, Editora Atlas. Para o direito interno, consulte uns livrinhos da Editora Saraiva, baratos, da coleção Sinopses Jurídicas. Os mais importantes são os vols. 17 e 18, mas o vol. 1 e o vol. 19 também podem servir (leia-se: seu conteúdo pode cair na prova).
Você tem alguma dica para a hora de estudar?
Eu segui uma dica que um amigo me passou, com excelentes resultados. Tenha um caderno de “fichamentos” para cada disciplina. A cada coisa que ler, um capítulo de um livro, um tópico do plano de estudos, faça logo em seguida o fichamento em que você resumirá as principais idéias do trecho lido e anotará suas observações, dúvidas e correlações mentais com outros livros, idéias ou capítulos que já tenha lido.
Na próxima vez em que for estudar essa matéria, leia primeiro o fichamento que escreveu da vez anterior. Se, ao ler, perceber que lhe vieram dúvidas acerca do conteúdo, esclareça-as voltando ao texto original. Em seguida, retome o livro e avance por mais um capítulo ou trecho e faça novo fichamento no caderno. Vá dormir.
Na terceira vez em que for estudar a disciplina, leia tanto o fichamento do primeiro dia quanto o do segundo. Avance mais um trecho, etc. Sempre, ao começar uma sessão de estudos, leia todos os fichamentos anteriores até já ter relido o primeiro deles por três vezes. Na quarta, descarte a releitura daquele e comece já do segundo.
Com esse método, você repassa cada conteúdo específico da matéria cinco vezes: uma ao ler, outra ao fichar, e mais três vezes com as releituras do fichamento. Se isso não fixar a matéria em sua cabeça, não sei o que o fará.
Você tem alguma dica para a hora de fazer as provas?
Tenho. O formato das provas muda um pouco a cada ano, mas alguma coisa posso dizer da minha experiência.
No Teste de Pré-Seleção (TPS): no meu tempo, a primeira fase da prova não era preparada pelo Cespe, que apenas a aplicava, e portanto não empregava o ignominioso método de anular uma questão correta para cada questão errada que o candidato marcar. A partir do segundo semestre de 2003, o Cespe passou também a elaborar a prova, e esse método passou a ser usado desde então. Fazer isso significa desencorajar o “chute”, pois em muitos casos torna-se melhor deixar a questão em branco do que arriscar a perder um ponto. Para mim isto privilegia o estudo obcecado e a memória em detrimento da capacidade de raciocínio, da inteligência e da criatividade. No método do Cespe, o candidato tem que saber a resposta. No método antigo, sempre se podia chutar, procedendo por eliminação e raciocinando com mil hipóteses e correlações em torno de uma questão desconhecida para chegar a uma ou duas alternativas prováveis.
Mesmo com as regras do Cespe, acho que vale a pena “chutar” algumas questões, desde que se tenha mais de 60% de certeza. E por fim um conselho prático e óbvio: reserve um tempo para preencher, sem erros, o cartão de resposta.
Na prova de português: Faça todos os exercícios menores e deixe a redação para o fim. A redação demanda tanta energia mental que, se você começar por ela, poderá ficar esgotado demais para fazer direito o resumo e os outros exercícios, mesmo que você não tenha usado todo o tempo disponível.
Escreva de forma contida e precisa. Evite viajar na maionese, e só esnobe erudição se tiver muita certeza do que está falando e de que aquilo se aplica estritamente ao caso analisado. Não procure “enfeitar” a redação.
Reserve um tempo para passar a redação a limpo. Pelo menos meia hora, melhor se forem quarenta minutos.
Apesar do que eu disse sobre a banca corretora, sou dos que acreditam em sua previsibilidade. Se for reprovado, vá obter vista da prova, como é seu direito. Estude as correções e os critérios que a banca usou, e tente aprender com os seus erros. Procure escrever como a banca quer que escreva.
Em todas as provas: se você acabou a prova muito antes do tempo máximo, é porque jogou fora a chance de ir melhor. Todo mundo sabe que tempo é dinheiro, mas nem todos se dão conta de que, em uma prova, tempo é NOTA. Se obtenho nota 5,5 em duas horas, poderia conseguir 6,5 ou 7,0 se dispusesse de quatro. Deixe a preguiça para outra hora. Resolva primeiro todas as questões que sabe, e labute nas que não sabe até o fim. Sempre se pode ter uma idéia luminosa, preencher um branco, refinar um argumento ou encontrar um erro nos vinte minutos finais. Como diriam os personagens de Monteiro Lobato, dê tratos à bola até descobrir a resposta para aquela questãozinha que te dará 0,2 ponto ou até acabar-se o tempo.
Nas provas orais: no momento em que escrevo, no 1º semestre de 2006, já não há provas orais. Quando voltarem, voltarei também a falar delas.
Cursos preparatórios
Devo fazer um curso preparatório?
Um curso preparatório — ou uma preparação com professores particulares — não é indispensável, mas é muito recomendável. Para além das aulas e do conteúdo propriamente dito, um curso lhe abrirá a oportunidade de ter contato rápido com os temas, de receber dicas de bibliografia e principalmente de socializar e conhecer gente que quer o mesmo que você. Dependendo de sua personalidade, se você tem que estudar por meses a fio, é melhor não fazê-lo sozinho, em casa, arriscando-se ao desânimo e à depressão. Um curso dá ânimo para continuar a estudar — nem que seja apenas por se estar pagando caro — a pessoas que, como eu, são demasiado preguiçosas quando se trata de estudo.
Aliás, pode chegar um momento em que o cursinho deixa de ajudar e começa a atrapalhar. Entre a segunda e a terceira fases, o que fiz foi SAIR do cursinho para que me sobrasse mais tempo para estudar de verdade. O tempo gasto no trânsito e em aulas irregulares e lentas, que tinham de atender a várias pessoas, passou para mim a não valer mais a pena a partir de certo ponto.
Os cursos preparatórios e as aulas particulares, por fim, são muito caros. Se não pode arcar com o tempo e o dinheiro necessários, o melhor que tem a fazer é encontrar outros candidatos em sua cidade e montar com eles um grupo de estudos. De novo: isso funciona para prazos mais longos. Estou convencido de que estudar sozinho é mais eficiente quando o tempo é curto.
O que é melhor? Fazer um curso completo ou contratar professores particulares individualmente?
Nenhuma opção é melhor em si. Depende do que estiver disponível em sua cidade. De maneira geral, São Paulo e Brasília, por exemplo, são conhecidos por seus cursos preparatórios bem organizados e bem preparados. Já o Rio de Janeiro até há algum tempo não tinha cursinhos completos, mas a ex-capital federal e ex-sede do Itamaraty conta com um rico leque de excelentes professores particulares especializados no concurso do Rio Branco, que precisam ser contatados e contratados individualmente. Nesse sistema você tem a vantagem de poder selecionar os melhores professores em cada matéria, contornando o maior problema dos cursinhos, que é a irregularidade do nível das aulas. Pelo relato de meus colegas cariocas, porém, aviso que contratar dessa maneira professores para várias disciplinas pode sair MUITO mais caro do que pagar a mensalidade de um cursinho completo.
Quais são os cursos preparatórios disponíveis em minha cidade?
Há poucos anos era muito difícil encontrar fora de Brasília ou São Paulo um curso preparatório especializado, mas agora há cursos em diversas grandes capitais do país, e outros estão aparecendo todo ano. A lista que segue está longe de ser completa. Se você é aluno, professor, dono ou simpatizante de um curso não listado aqui, faça a gentileza de me mandar um e-meio (endereço disponível na minha página web) listando as informações de contato, o endereço e, se houver, o endereço web do curso, que terei o maior prazer em incluí-lo neste espaço.
Brasília
Curso JB (também conhecido como “Cursinho do Ministro”, talvez pelo fato de o dono ser um diplomata de carreira. Até 2004, o nome era “Cursinho do Conselheiro”. Veja hierarquia da carreira).
Dados
Carreira Diplomática (outro curso bastante conhecido em Brasília)
Dados
Belo Horizonte
IBRAE – o primeiro, e dificilmente ainda o único, curso preparatório para o Rio Branco em Minas Gerais.
Alvares Cabral, Nº 397 - sala 1901
Telefone: (031) 3224-8073
São Paulo
Grupo de Humanidades - o curso que fiz. Recomendo.
Dados
Curso Rio Branco (não confundir com o próprio Instituto Rio Branco)
Dados
Curso Itamaraty (não confundir com o Itamaraty)
Dados
Professores particulares em São Paulo (DDD 011):
Alison Francis (Inglês) 3864-0409
Claudia Simionato (Português) 9681-8022
José Roberto Franco da Fonseca (Direito Internacional) 3255-8326
Tânia Melo (Inglês) 3275-9423
Rio de Janeiro
Argus Cultura
Dados
Curso Clio - quem me indicou elogiou muito sua infraestrutura, corpo docente e acervo.
Rua Gonçalves Dias, 85, 5º andar, Centro
Telefones: (21) 2221-9879 / 2221-2958
Professores privados no Rio (todos com DDD 021):
Adriano da Gama Khury (Português) 2551-5162
Edgar Pêcego (História do Brasil) 2539-8014
Eduardo Garcia (Português) 2205-7484
Lídia Bronstein (Geografia) 2239-4723
Marcus Vinicius (História Geral e Questões Internacionais Contemporâneas) 2535-3018
Paul Rickets (Inglês) 2511-0940
Raquel Dana (Inglês) 2235-0254
Sônia Ramos (Português) 2239-8418
Suzana Roisman (Inglês) 2274-5874
Williams Gonçalves (História Geral e Q.I.C.) 2568-4354
Que curso você recomenda?
O curso que eu fiz chama-se Grupo de Humanidades. Fica num sobrado simpático dentro de uma vilinha na Vila Mariana, em São Paulo. Estava longe de ser perfeito, claro. Havia professores muito bons e outros nem tanto. Mas não me arrependo, em absoluto. Na época, era o único, creio, a ter um módulo extensivo, com aulas todos os dias da semana. Não saberia, porém, recomendar o melhor curso. Cada um tem seus pontos fortes e fracos, horários diferentes, mensalidades diferentes. Se houver opção em sua cidade, sugiro que visite alguns, peça para assistir a algumas aulas, e chegue à sua própria conclusão.
O Instituto Rio Branco
Quanto tempo dura o curso do Rio Branco? (PROFA-I)
O Programa de Formação e Aperfeiçoamento de Diplomatas, estritamente falando, dura um ano. O curso do Rio Branco, porém, costuma durar mais. Como desde 2002 o curso transformou-se em um mestrado, há aulas adicionais que fazem parte do mestrado, mas não do PROFA-I, e há tempo previsto para sessões de estudo com seu orientador e para elaborar a dissertação acadêmica. Conte, portanto, com dois anos de vida acadêmica.
Eu ganharei uma bolsa durante o curso?
Como já disse acima, ao ingressar no Rio Branco, o aluno ingressa também na carreira diplomática, no grau de Terceiro Secretário. Não tem necessidade alguma de uma bolsa de estudos, visto que recebe o salário integral do início da carreira.
Há aulas de línguas?
Há aulas obrigatórias de inglês, francês e espanhol. O objetivo é que todos egressem do Rio Branco com conhecimento operativo das três línguas. Além disso, o Instituto Rio Branco oferece aulas opcionais de diversos outros idiomas, do alemão ao chinês, passando pelo árabe. No meu tempo, a turma reunia um número mínimo de interessados e entrava em contato com um professor, que era então remunerado pela instituição. Recentemente, esse sistema sofreu reformas, e ainda não está claro qual será o novo método de ensino de línguas estrangeiras que não as três já mencionadas.
Quais são as matérias estudadas?
Além dos idiomas, o PROFA-I tem aulas de Linguagem Diplomática, Direito Internacional, Histórias das Relações Exteriores do Brasil, Política Externa Brasileira, Economia Internacional, Teoria das Relações Internacionais e Leituras Brasileiras.
Além dessas disciplinas regulares, o Instituto Rio Branco costuma oferecer outras disciplinas, ligadas ou não à atividade do mestrado, segundo seus objetivos. Há ainda uma fervilhante atividade de seminários e palestras que põe os alunos em contato com personalidades acadêmicas, diplomatas, políticos e autoridades do Brasil e do mundo.
Como assim, “Mestrado em Diplomacia”?
Desde 2002 o curso do Instituto Rio Branco tem valor de mestrado, o que requer, como sua atividade principal, o preparo pelo aluno de uma dissertação acadêmica. Esta pode versar sobre temas ligado às relações internacionais do Brasil, ao direito internacional, à economia internacional ou à questões de identidade nacional. Como vê, a margem é ampla. O aluno escolhe seu orientador acadêmico dentre uma lista de nomes fornecida pelo Instituto. Nem todos são professores do Rio Branco.
O curso do Rio Branco é reconhecido pela CAPES como Mestrado Profissional, avaliado com conceito 4 em uma escala de 1 a 7.
Como foi, pra você, estudar no Rio Branco?
O Rio Branco é muito idealizado por quem está fora. Quando se entra, descobre-se que é um curso como o de qualquer universidade, com algumas aulas boas, outras ruins, professores sérios, professores picaretas, trabalhos entregues na última hora e, dependendo do caso, uma ou outra guerrinha de bolas de papel amassado. A diferença é que os alunos vestem terno e gravata e ganham já o salário inicial da carreira, para estudar. Eu não sou maluco de desprezar o privilégio de receber dinheiro para estudar, mas é verdade que alguns se cansam cedo das carteiras do Rio Branco e querem logo ir para o Itamaraty, para trabalhar “como gente grande”. Para mim, com certeza, o contato com minha turma foi a melhor coisa do Rio Branco: o concurso se encarrega de que muitas pessoas inteligentes e interessantes irão tornar-se seus colegas.
Você gostou das aulas?
Gostei muito de poucas e razoavelmente de algumas, o que me coloca, em grau de satisfação, acima da média das pessoas de minha turma e de outras turmas que conheço. Acho que o problema é que muitos chegam ao Rio Branco esperando demais e se decepcionam. Por mais que reclamem do curso ou das aulas, porém, não vi ninguém, até agora, desistir da carreira por causa disso.
É possível ser reprovado?
Teoricamente, sim. Teoricamente, o Rio Branco insere-se naqueles três anos de estágio probatório, previstos em lei, durante os quais o funcionário público recém-ingresso ainda não adquiriu estabilidade na carreira, podendo ser demitido sem necessidade de uma acusação grave e de um processo administrativo. Assim, em teoria, se um aluno não passar no Rio Branco, não será confirmado no Serviço Exterior — em outras palavras, perderá o emprego.
Na prática, só será reprovado quem se esforçar muito para isso. Afinal, se você passou no concurso é porque lhe sobra capacidade para acompanhar o curso, a menos que resolva mandar tudo às favas, faltar à maior parte das aulas e não fazer nenhuma prova ou trabalho.
Se você não fizer a dissertação de mestrado, terá, de todo modo, cumprido o PROFA-I e prosseguirá sua carreira normalmente, apenas sem o título acadêmico.
É possível, ainda, “ficar de segunda época” em uma disciplina ou outra. Nesses casos, pode-se combinar com o professor a feitura de um trabalho ou uma prova suplementar que resolva o problema.
Poderei, durante o Rio Branco ou depois dele, exercer alguma outra atividade remunerada na iniciativa privada?
Diplomatas são funcionários públicos federais e portanto devem ter dedicação exclusiva ao Estado, sob pena de inquérito administrativo e possível exoneração. Exceções únicas: atividades de magistério e remuneração a título de direitos autorais por obras de autoria própria (e.g., livros, artigos, fotografias). Tenho colegas que dão aula em faculdades particulares, sem problema.
E haverá tempo disponível para isso?
Tempo, durante o curso no Rio Branco, há. Depois, vai depender da divisão em que for trabalhar, do ritmo do seu chefe e da sua própria disposição e prioridades.
Durante o curso, há quantos meses de férias por ano?
Dois meses de recesso, janeiro e julho. No final de dezembro (23 em diante) também não costuma haver aulas. Mas oficialmente só temos um mês de férias, e após um ano no Rio Branco podemos tirá-las e ganhar o adicional de férias como todo funcionário de carteira assinada, mas o período de férias tem de coincidir com o recesso no Rio Branco.
Terei um estágio no exterior ao fim do Rio Branco? Por quanto tempo?
Essa é uma pergunta sensível. Tradicionalmente havia um estágio de três meses em uma embaixada ou outro posto do Brasil no exterior. Esse estágio, porém, nunca foi considerado parte integrante do curso do Rio Branco, e sua duração, formato e destino costumam ficar à mercê das preferências flutuantes dos diretores do Instituto e dos manda-chuvas do Itamaraty. A turma de 2002, por exemplo, foi enviada por um ano inteiro ao exterior, deixando de matar a sede anual da Secretaria de Estado em Brasília por novos diplomatas. A turma seguinte pagou pela prolongada ausência da anterior ficando sem estágio e sendo lotada imediatamente nos departamentos e divisões do Ministério. Talvez volte a haver estágio em anos vindouros. Talvez não.
E o PROFA-II?
Não tenho a menor idéia de por que o PROFA-I chama-se PROFA-I, pois não há nenhum PROFA-II. Isso não quer dizer que o diplomata não tenha que voltar a estudar. Ao longo de sua carreira, ele poderá voltar duas vezes às mesas escolares do Rio Branco: uma vez para fazer o Curso de Aperfeiçoamento de Diplomatas (CAD), obrigatório para promoção ao cargo de Primeiro Secretário; e outra para o Curso de Altos Estudos (CAE), obrigatório para promoção ao cargo de Ministro de Segunda Classe.
Carreira diplomática
O que “faz” um diplomata?
O diplomata é o funcionário público que cuida da formulação da política externa e do manejo diário das relações exteriores do Estado Brasileiro, incluindo o apoio a cidadãos brasileiros no exterior. Você com certeza já ouviu falar que, com a globalização, as tecnologias de comunicação e transporte e a crescente interdependência entre os Estados, os países envolvem-se em um número cada vez maior de questões cada vez mais especializadas etc. etc. etc. Na prática, isso significa, para os diplomatas, mais trabalho. Há cada vez mais órgãos internacionais, reuniões e foros bilaterais (dois países), plurilaterais (alguns países) e multilaterais (um montão de países) sobre os temas mais diversos, nos quais o Brasil tem pelo menos algum interesse. Isso, somado à cada vez maior comunidade brasileira na diáspora e à necessidade de abrir novas embaixadas em países menores, explica por que o governo está atualmente ampliando em 25% o quadro de diplomatas.
Qual a diferença entre embaixada e consulado? O diplomata trabalha nos dois?
Em tese, uma embaixada é a representação do Estado Brasileiro junto a um Estado estrangeiro. Trata, portanto, dos contatos políticos e econômicos intergovernamentais, e sempre se localiza na capital política do país em questão. Um consulado é um posto avançado do Estado Brasileiro em outro país, com o fim principalmente de prestar apoio aos brasileiros no exterior, mas também, supostamente, de realizar atividades de divulgação cultural, promoção comercial e assistência à iniciativa privada. Se em cada país há no máximo uma embaixada do Brasil, por outro lado em um só país pode haver diversos consulados, desde que a existência de várias cidades importantes ou com grande presença de brasileiros o justifique. É comum ainda que a embaixada acumule as funções de consulado na capital em que se localiza.
No início do século XX, havia, no Brasil, carreiras separadas para funcionários diplomáticos e consulares. De há muito, porém, as carreiras são unificadas, e o diplomata pode servir tanto em embaixadas quanto em consulados.
Como é o dia a dia de um diplomata?
O dia-a-dia do diplomata pode ser muito diferente, dependendo de onde ele está e do que está fazendo. Podemos dividi-lo em dois momentos principais: exterior e Brasília. Toda a carreira se alterna entre estes momentos: alguns anos no exterior, alguns em Brasília. Alguns no exterior, alguns em Brasília. E assim vai...
Tá bom, como é o dia-a-dia de um diplomata quando no Brasil?
Quando se está em Brasília, como é o meu caso atualmente e é sempre o caso de quem está começando, o diplomata é um funcionário público, um burocrata do Ministério das Relações Exteriores. Há montes de divisões, departamentos e áreas, cada uma cuidando de uma coisa. ONU, meio-ambiente, desarmamento, cultura, fome no mundo, Mercosul, Alca, relações bilaterais (um departamento para cada continente) e por aí vai. Prepara-se discursos, relatórios, instruem-se as embaixadas no exterior, faz-se pesquisas, viaja-se para participar de encontros internacionais que duram alguns dias. Há também divisões administrativas, em que o diplomata não vai cuidar de política externa, mas do funcionamento do Ministério: RH, material, patrimônio, passagens aéreas, hotéis, passagens etc. Há por fim o Cerimonial, que organiza a logística de eventos que o Brasil sedia, organiza visitas de Chefes de Estado ao Brasil e planeja e acompanha as viagens do nosso Presidente ao exterior. É onde existe de fato aquele trabalho clichê de um diplomata — dispor quem senta onde no jantar, fazer convites, preparar salamaleques. Mas não é só isso. O Cerimonial planeja agendas, reserva hotéis, salões de convenções, prepara transportes, credenciais e coordena o trabalho de segurança com a Polícia Federal e o Exército.
Ao longo de sua carreira, um diplomata trabalhará em diversas divisões, e terá de se adaptar a assuntos e rotinas um tanto diferentes. Muitas tarefas, no entanto, envolvem escrever. Escrever para as embaixadas nossas no exterior, dando-lhes instruções, escrever para as embaixadas estrangeiras aqui, escrever para outros ministérios de modo a coordenar políticas ou pedir apoio ou participação em algum evento, escrever relatórios para serem lidos pelo secretário-geral, pelo ministro e pelo presidente da república. Escrever discursos para alguém pronunciar, escrever, escrever, escrever... Há ainda incontáveis reuniões de debate, coordenação ou negociação, seja dentro do Ministério, seja com outros Ministérios, seja com outros países.
E no exterior?
No exterior é que o diplomata fica realmente parecido com o conceito que as pessoas têm de diplomata. Com seus companheiros de embaixada (de dois a vinte e poucos diplomatas brasileiros, dependendo do país, mais diversos oficiais e assistentes de chancelaria e outros funcionários), ele irá acompanhar a vida política do país e fazer relatórios para os colegas da divisão correspondente em Brasília, sob o comando do Embaixador, que é o chefe do posto. Poderão agitar eventos culturais, participar de coquetéis com autoridades do país e com diplomatas de outros países, preparar o terreno para visita de autoridades brasileiras ao país em que ele estiver, cuidar da administração da embaixada, responder à imprensa local se ela quiser saber algo sobre o Brasil, e em geral ajudar a representar nosso país no exterior. Deverão escrever muito, também, preparando comunicados e relatórios para seus pares em Brasília.
Nos consulados, os diplomatas ajudarão os cidadãos brasileiros no exterior. Serão a face amiga do Estado brasileiro para o brasileiro que está lá fora. Vistos, casamentos, prisões, expulsões, imigração, crimes, comércio, negócios... não ache que brasileiro não dá trabalho. A vida de um diplomata, enfim, poderá ser muito diferente dependendo da área de trabalho, quer se esteja no exterior, quer no Brasil.
Qual é o “perfil” para ser diplomata?
Que pergunta estranha... mas como já ma fizeram algumas vezes, vou responder. Não há um "perfil" para ser diplomata. Já vi gente de todo tipo, lá. Todo tipo. Mas acho que, em termos de formação acadêmica e interesses, o tipo padrão é formado em direito, tem interesse por questões internacionais e gosto por línguas. Talvez um pendor para a insanidade leve, mas isso é controverso. Porém, já escrevi que a vida do diplomata muda muito ao longo da vida. A cada poucos anos um tema, uma situação, um país, uma língua diferentes. Acho, portanto, que uma característica desejável é a capacidade de adaptação e de acomodação.
Quanto tempo se passa no exterior?
O tempo varia segundo a carreira de cada um. Você pode ficar mais tempo no exterior ou mais no Brasil. É razoável supor que metade da vida profissional de um diplomata, em média, desenvolve-se em postos no exterior. Não é possível, porém, passar mais de oito anos consecutivos no exterior (dez anos para embaixadores), e dificilmente um diplomata passa mais de três anos em um só posto.
Se eu não quiser, serei obrigado a me mudar para um determinado país?
Não. Ninguém é obrigado a ir para onde não quer, embora o Ministério disponha de diversas maneiras de incentivar e convencer as pessoas a irem para países prioritários para a política externa. Aliás, só é removido (transferido para um posto no exterior) quem se inscreve, internamente, em um plano de remoção. Porém, como a ascensão na carreira tem entre seus requisitos legais um número mínimo de anos de serviço no exterior, todos terão que se inscrever mais cedo ou mais tarde, caso queiram progredir na carreira. O salário no exterior, sempre muito maior do que no Brasil, também é incentivo relevante.
Como é, então, que escolho os países onde vou servir?
Há muita flexibilidade e razoável poder de escolha, embora seja difícil obter uma vaga nos postos mais concorridos. Você escolhe para que país irá segundo as vagas disponíveis no momento em que pede a remoção, escolha esta condicionada por regras que se alteram a cada plano. Os postos no exterior são classificados em A (países desenvolvidos e cidades com boa qualidade de vida, como Paris, Nova York, etc.), B (países e cidades com qualidade de vida intermediária, como Praga, Montevidéu, Santiago), e C (o resto, como Pequim, Nova Delhi, Quito e cidades da África subsaariana). Estão estudando criar uma categoria D, para os postos em que a vida é mais difícil.
O sentido dessa categorização é que há várias regras para equilibrar a escolha dos postos e reduzir privilégios e injustiças: em postos C, por exemplo, você ganha mais em relação ao custo de vida do país e depois tem o direito de sair para um posto A; não se pode ir para dois postos A consecutivos, etc.
É possível seguir uma carreira acadêmica paralela à diplomática?
São cada vez mais raros os casos de diplomatas como Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto, José Guilherme Merquior e outros, que conseguem conciliar a atividade de diplomata com uma carreira extremamente bem sucedida em outra área, como a acadêmica. Será que isso quer dizer que os diplomatas hoje têm que trabalhar mais? De qualquer forma, isso não quer dizer que não haja abertura. Muitos aproveitam seus períodos no exterior para fazer um doutorado, por exemplo, conciliando-o com o trabalho. Diversos outros seguem dando aulas e publicando livros. Não há licenças especiais para isso, porém, exceto licenças não-remuneradas. Se quer seguir carreira acadêmica, é por sua conta.
Como é a hierarquia da carreira?
É a seguinte, de cima para baixo na cadeia alimentar:
Ministro de Primeira Classe (vulgo “Embaixador”).
Ministro de Segunda Classe (vulgo “Ministro”)
Conselheiro
Primeiro Secretário
Segundo Secretário
Terceiro Secretário
Exceto em casos especiais, apenas um diplomata que alcança o grau de Ministro de Primeira Classe pode servir como embaixador do Brasil em algum país estrangeiro, daí esse grau ser chamado, por comodidade, de “Embaixador”. Em países pequenos e menos importantes, com embaixadas menores, um Ministro de Segunda Classe pode eventualmente servir como Embaixador. Há também indicações políticas, normalmente raras, em que o Presidente da República designa alguém de fora da carreira como Embaixador. Foi o caso, por exemplo, do ex-presidente Itamar Franco, na Itália. Nesses casos, o embaixador “civil” poderá contar como seus assessores com diplomatas de carreira experientes.
Se virar diplomata, vou chegar a ser embaixador? Quando?
Com a ampliação dos quadros, o aumento da idade média em que se ingressa na carreira e o afunilamento das promoções, a maior parte dos diplomatas que hoje ingressam no Itamaraty não chegará nunca ao grau de Ministro de Primeira Classe, nem chefiará uma embaixada. Não obstante, a carreira está cheia de oportunidades de realização profissional e pessoal. Não é preciso ser embaixador para se envolver em negociações internacionais, contribuir para formar a posição brasileira em diversos temas ou gozar ao redor do mundo de experiências de vida gratificantes, em contato com pessoas e culturas interessantes e diferentes.
Como ficam o cônjuge e os filhos quando o diplomata vai morar no exterior?
É fato conhecido que a vida pode não ser lá muito fácil para a família de um diplomata. Para o cônjuge não-funcionário do Serviço Exterior, e dependendo de sua profissão, pode ser difícil levar adiante uma vida profissional mudando-se de país a cada três ou quatro anos. O mesmo motivo torna não trivial a educação dos filhos. A maior parte dos diplomatas opta por manter seus filhos em escolas de rede internacional, como a escola americana ou a escola francesa, ao menos quando estão no exterior. Isso lhes permite manter currículo e língua constantes ao longo de tantas mudanças. São escolas caras, contudo. Por fim, não há nenhum acordo internacional facilitando o emprego de cônjuges ou familiares de diplomatas quando no exterior e, exceto por um acréscimo de salário baseado no número de dependentes, não há outra forma de apoio do MRE às famílias no estrangeiro. Uma reivindicação antiga dos funcionários é uma ajuda de custo para educação, mas não há perspectivas de que seja atendida, por enquanto.
Quanto ganha um diplomata?
O Ministério do Planejamento divulga uma lista, atualizada periodicamente, com os salários de todos os servidores públicos federais. Os salários dos diplomatas, de Terceiro Secretário a Ministro de Primeira Classe (vulgo "Embaixador") estão todos lá. Adianto que hoje, maio de 2006, um Terceiro Secretário entra na carreira recebendo R$ 5.103,65 brutos (R$ 3.538,44 após impostos e previdência). Após seis meses de estudo, o salário sobe para até R$ 3.853,59 líquidos ou um pouco menos, dependendo da avaliação individual que lhe fizerem.
Achou muito ou pouco? Tem gente que reclama, mas o fato é que está correndo, no Congresso, projeto de lei para o aumento dos salários dos funcionários do Serviço Exterior, o que inclui diplomatas, oficiais e assistentes de chancelaria.
O que foi dito vale para o Brasil. No exterior, os salários são maiores e calculados em dólar. É difícil precisar os valores, pois variam de posto para posto de acordo com o custo de vida local e outros fatores e, de pessoa para pessoa, de acordo com o estado civil do diplomata, seu nível hierárquico e o número de seus dependentes. Em média, porém, um Terceiro Secretário pode esperar ganhar entre quatro e cinco mil dólares, líquidos, quando no exterior. Um Conselheiro, em torno de sete a nove mil. Um Embaixador, em torno de onze a quinze mil, além de verbas para gastos com recepções oficiais e representação.
Além disso, os diplomatas no exterior recebem uma ajuda de custo para o aluguel, que cobre de 60 a 100% do valor do contrato até um valor determinado, dependendo do posto.
Outros temas
Quem é você?
Incluí essa pergunta porque entendo que a compreensão e interpretação de um texto, e principalmente de um texto que contenha opiniões e pontos de vista pessoais, como este, depende de se saber quem foi que o escreveu. O mesmo juízo, emitido por um embaixador no final da carreira, por um filho e neto de diplomatas, por uma jovem terceira secretária ou por um acadêmico não-diplomata será recebido de forma diferente por quem o lê, caso este saiba de quem partiu.
Pois bem, nasci em 1979, em uma família de classe média. Meu pai é oficial da Aeronáutica. Com exceção de um ano vivido com minha família na França, quando contava seis anos, nunca, até hoje, passei mais do que uns poucos dias em qualquer país estrangeiro.
Sou formado em jornalismo pela Universidade de São Paulo. Nunca, antes de completar a universidade, cogitei seriamente prestar o concurso do Instituto Rio Branco e ingressar na carreira diplomática; aliás, por muito tempo sequer sabia da existência desse instituto ou devotava qualquer interesse à diplomacia como atividade ou profissão. Não há diplomatas em minha família, nem nunca, até me envolver com o concurso, conheci nenhum.
Durante a faculdade, e ao longo de dois anos depois de formado, trabalhei como jornalista em diversos veículos, com emprego fixo ou como freelancer, incluindo a revista Superinteressante, a Revista Submarino (na internet, hoje extinta), a Folha de S. Paulo, o site de tecnologia Hotbits e outros.
Não sei bem explicar até hoje por que prestei o concurso. Jornalistas e diplomatas, creio, têm em comum o entenderem e fazerem de tudo um pouco, sem conhecerem a fundo coisa alguma. Meu pai já me chamava a atenção para o concurso há alguns anos sem que eu lhe tivesse dado bola. No início de 2002, porém, resolvi prestá-lo “só para ver”, sem estudar, e fui reprovado na prova de português da segunda fase. Meu interesse, porém, foi capturado, e no segundo semestre do mesmo ano procurei um curso preparatório. Prestei o concurso no ano seguinte e fui aprovado.
Ingressei na carreira diplomática em julho de 2003, aos 24 anos de idade. Concluí o curso do Instituto Rio Branco em março de 2005. Minha dissertação de Mestrado em Diplomacia foi aprovada com o tema “A política-externa norte-americana e a influência dos grupos de pressão no Congresso dos Estados Unidos”.
Hoje, março de 2006, como Terceiro Secretário, trabalho no Departamento de Integração do Ministério das Relações Exteriores. Até agora, não fui “removido” (transferido para um posto no exterior), e não espero sê-lo por pelo menos um ano, ainda. Minha experiência profissional no exterior resume-se, por enquanto, a viagens curtas para participar de reuniões entre governos dos países do Mercosul.
Quando ingressamos no Rio Branco, o Itamaraty nos providencia residência em Brasília?
Providencia nada. Mas quem está na carreira tem EXPECTATIVA de direito a um apartamento funcional. Há um bloco de apartamentos do Ministério em Brasília que é destinado aos diplomatas recém-ingressos. São 36 apartamentos de um quarto, sala, varanda, banheiro e cozinha na Asa Sul. Muito bons para um solteiro, apertados, mas suficientes, para um casal, péssimos para quem tem filhos. Como são só 36, há uma lista de espera. Dentro da mesma turma, o número de dependentes é o principal critério para ordenar a lista, e a classificação no concurso é o desempate. Para você ter uma idéia, depois de um ano e meio, a minha turma (ingresso em 7/2003) ainda não havia acabado de receber os apartamentos. Eu recebi o meu após um ano de espera. A demora para os que entram na carreira agora provavelmente será bem maior do que para mim, por causa do aumento do número de vagas. Em suma: não conte com apartamento tão cedo. Em tempo: depois de alguns anos, chega-se por outra lista de espera aos chamados apartamentos definitivos, de dois ou três quartos. Mas esses realmente demoram, e os que estão chegando do exterior têm prioridade sobre os recém-ingressos. Uma página do site do MRE informa que o Ministério possui ao todo 450 imóveis no Distrito Federal. Não imaginava que fossem tantos.
O MRE fornece alguma passagem aérea para minha cidade natal, periodicamente, ou sempre que quiser visitar meus familiares terei de arcar com as despesas de passagem?
Não somos deputados. Ganhamos nosso salário e nos viramos com ele. Sequer as despesas da primeira mudança para Brasília serão cobertas pelo MRE, embora futuras mudanças para o exterior sim.
Serei reprovado no concurso por causa da minha tatuagem?
Não há NADA escrito em lugar nenhum que proíba as pessoas de usarem tatuagens no Itamaraty. Não vou negar que a instituição não tenha superado todos os seus ranços conservadores, tradicionalistas — nós trabalhamos de terno e gravata, pra começar. Quando havia provas orais, teoricamente, e digo TEORICAMENTE, seria possível um aluno ser mal visto por um ou mais membros da banca por caua de uma tatuagem demasiado agressiva ou aparente e acabar reprovado, embora esse jamais seria o motivo oficial. No momento, porém, não há provas orais, de modo que faltam até os instrumentos para um controle como esse. E eu conheço diplomatas que usam tatuagens.
Há uma idade máxima, ou "certa", para entrar na carreira?
Não. Consta que há muitos anos havia uma idade máxima de 28 anos, mas foi derrubada por inconstitucional. Conheço quem tinha visto mais de quarenta primaveras quando entrou na carreira. A idade média de entrada vem aumentando desde que se passou a exigir curso superior completo para entrar na carreira. Casos de pessoas que começam a carreira com trinta, trinta e poucos anos, mestrado e até doutorado completos são bastante comuns. Na minha turma, a caçulinha tinha 21 anos e a mais velha 41. Há porém, segundo a Lei do Serviço Exterior, certos limites máximos de idade para determinados graus da hierarquia. Se, antes de atingido o limite para Conselheiro, por exemplo, o funcionário não for promovido a Ministro de Segunda Classe, ele entra para o chamado Quadro Especial e, apesar de continuar trabalhando normalmente, não poderá mais ser promovido.
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Aqui termina a FAQ do Candidato à Diplomacia. Espero que lhe possa ser de algum proveito.