O presente texto foi retirado do blog de Paulo Roberto de Almeida, no seguinte endereço: (EUA: entre a diplomacia e o unilateralismo...). Concorde-se ou não com PRA, não há sombra de dúvida quanto à sua excelência e honestidade intelectual. Quanto a mim, tenho uma enorme afinidade quanto a seu pensamento, guardadas algumas ressalvas devidas, creio eu, mais a diferenças relativas a nossos temperamentos, a uma ou outra declaração tomada por mim como demasiado peremptória, do que a concepções incompatíveis. É claro que levo em conta o " muito de feijão que ainda tenho de comer" para poder me comparar a Paulo Roberto, mas sobre isso a passagem por mim selecionada d'O Príncipe diz muito.
Vinícius Portella
Porto Alegre,
22 0129 fev 2010
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Uma opinião emitida em novembro de 2009, mas não menos importante como reflexão atual.
Lapso de poder
Anne Applebaum
New York Times, 26/11/2009
Como dois cometas correndo um em direção ao outro, vindos de extremidades opostas do espaço, dois fenômenos diferentes em partes diferentes do mundo cresceram na consciência pública na semana passada. Separadamente, eles poderiam não ter tido importância cósmica. Mas juntos podem ser um sinal interessante de coisas que virão.
Na China, o presidente Barack Obama se encontrou com seu homólogo, o presidente Hu Jintao. Ele também se encontrou com o primeiro-ministro chinês, Wen Jibao. O primeiro recebeu mais atenção, mas o segundo foi mais interessante: Wen disse a Obama que "a China discorda da sugestão de um 'Grupo dos Dois'", segundo a agência de notícias chinesa "Xinhua".
"A China ainda é um país em desenvolvimento", disse, e "devemos sempre nos manter sóbrios a esse respeito". A China está deliciada em manter seu relacionamento econômico com os EUA, mas "persegue a política externa independente da paz e não se alinhará com qualquer país ou [bloco de] países".
Tradução: a China não vai cooperar para impor sanções ao Irã, a China não vai atrapalhar o programa de mísseis nucleares da Coreia do Norte e a China não vai ajudar a solucionar os problemas do Afeganistão, do Oriente Médio ou de qualquer outro lugar. Em suma, a China decidiu que não será um parceiro pleno dos EUA em política externa.
Aproximadamente ao mesmo tempo, os líderes da Europa estavam trancados em salas proverbialmente enfumaçadas (hoje sem fumaça), discutindo sobre quem deveria receber o novo cargo de "presidente" da União Europeia e quem deveria se tornar o novo "alto representante", ou ministro das Relações Exteriores, europeu.
Essas conversações representavam o auge de uma década de diplomacia, debates e referendos nacionais destinados a produzir uma política externa europeia mais unida e dar à Europa um único número de telefone que Obama possa chamar quando quiser conversar.
Resultado: o presidente da Europa será o primeiro-ministro belga Herman Van Rompuy, um político desconhecido fora de seu país. O ministro das Relações Exteriores da Europa será a britânica Catherine Ashton, uma burocrata desconhecida até em seu próprio país.
Candidatos de muito maior experiência e influência - incluindo o ex-primeiro ministro britânico Tony Blair e o ministro das Relações Exteriores sueco Carl Bildt - foram rejeitados, aparentemente por medo de que teriam mais experiência e influência do que os poderes de fato. O semanário "Der Spiegel", da Alemanha, anunciou esta notícia com a manchete "Europa escolhe ninguéns".
Tradução: a Europa pode ter um novo número de telefone, mas quando Obama ligar a pessoa do outro lado da linha ainda não será capaz de agir. A "Europa" não será uma entidade unificada capaz de coordenar uma política unificada no Irã, na Coreia do Norte, Afeganistão, Oriente Médio ou qualquer outro lugar tão cedo. Em suma, a Europa não pode se tornar um parceiro pleno dos EUA em política externa.
E assim ficamos com uma situação curiosa: os EUA não querem mais ser a única superpotência. O presidente norte-americano não quer mais ser o líder de uma única superpotência. Ninguém mais quer que os EUA sejam a única superpotência, e na verdade os EUA não têm mais condições de ser a única superpotência. Mas os EUA não têm um parceiro óbvio com o qual compartilhar o papel de superpotência, e se os EUA deixassem de ser uma superpotência nada e ninguém ocuparia seu lugar.
Isso poderia não ser o fim do mundo - alguns lugares problemáticos poderiam passar um longo período de negligência benigna - e poderia não durar para sempre. A Europa, quando contada como uma entidade única, ainda é a maior economia do mundo. A China, seja o que for, ainda é a economia de mais rápido crescimento no mundo. Mais cedo ou mais tarde, a simples necessidade de defender seus interesses econômicos poderia convencer uma ou ambas a começar a levar mais a sério o mundo exterior.
Isso significa que o governo Obama tem um problema, porém: ele chegou ao cargo prometendo trabalhar com os aliados, mas logo poderá descobrir que não há aliados com quem trabalhar.
A Europa ainda é nossa melhor esperança, porque os europeus compartilham a maior parte de nossos valores. Mas organizar sanções com uma Europa dividida - sem falar em uma operação militar - continuará sendo uma grande tarefa.
Enquanto isso, a China está adquirindo vastos interesses estrangeiros, negociando na África e na América do Sul, assim como na Ásia, e mantendo um vasto exército. Mas a China parece desinteressada em aderir a uma campanha internacional contra o terrorismo, a proliferação nuclear ou qualquer outra coisa.
Os militares e a segurança globais parecem, portanto, destinados a permanecer nas mãos dos EUA, quer eles queiram quer não.
A meio caminho de sua presidência, George W. Bush descobriu que tinha de abandonar o unilateralismo em favor da diplomacia. Hoje nos perguntamos: em algum momento de sua presidência Obama descobrirá que tem de abandonar a diplomacia em favor do unilateralismo?
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Anne Applebaum: Jornalista e colunista do Washington Post, Anne Applebaun ganhou o prêmio Pulitzer pelo livro "Gulag: uma História". Escreve regularmente sobre política norte-americana e assuntos internacionais.
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